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sexta-feira, 30 de março de 2012

Os Perfumes da Terra



Ultimamente, tenho ouvido muito sobre o "perfume" que uso.
Onde vou, sempre tem alguém que me pergunta o nome, outras pessoas não perguntam: afirmam.
Outro dia, uma amiga muito querida disse que meu cheiro lhe era familiar, depois disse que lembrava o cheirinho de sua avó. Pensei logo que havia mudado de patamar, não fui nem mãe e já fui promovida a avó!
Engraçado como "nossos cheiros" despertam sensações boas e outras, nem tanto. 
Nunca pude usar perfumes porque sou alérgica a eles, muito alérgica - apesar de adorá-los, mantenho uma certa distância desconfiada por aquilo que podem me causar. Uso uma colônia, das mais suaves e discretas assim como gosto e procuro ser, mas nunca gostei de dizer o que uso. Desde muito cedo me causava um desconforto, que eu mesma achava esquisito, alguém me sondar o que eu estava usando que cheirava dessa ou daquela maneira. É uma sensação de invasão a que tenho, hoje compreendo bem isso, e ninguém, pelo menos que eu saiba, gosta de sentir invadido.
Os últimos comentários, me trouxeram à lembrança um texto de minha Estrela Clarice Lispector, que fala exatamente disso e, talvez, minha solução seja tentar achar outra coisa que combine comigo para que eu possa continuar a ter o direito ao meu segredo.

Já falei do perfume do jasmim? já falei do cheiro do mar. A terra é perfumada. E eu me perfumo para intensificar o que sou. Por isso não posso usar perfumes que me contrariem. Perfumar-se é uma sabedoria instintiva. E como toda arte, exige algum conhecimento de si própria. Uso um perfume cujo nome não digo: é meu, sou eu. Duas amigas já me perguntaram o nome, eu disse, elas compraram. E deram-me de volta: Simplesmente não eram elas. Não digo o nome também por segredo. É bom perfumar-se em segredo.

LISPECTOR, Clarice. In: Aprendendo a viver. Rio de Janeiro: Rocco, 2004. p.90.