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quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

UMA PROFISSÃO DE FÉ


Poesia é uma suave força do Todo, que polariza todas as humanas faculdades - na mente, no sentimento e transfere contiguidades, trazendo um saber inominado e que é plenitude. Deve provir de presença atuante, nesse Todo de Força, sendo uma convergência de clarividências em absoluta gratuidade.

Sabemos que "holos", termo já cogitado na antiga Grécia, quer dizer esse "Todo" - e holística é a tendência, que se supõe própria do universo a sintetizar unidades organizadas - isso diz o dicionário. É proposta de integração das diversas formas do conhecimento manifestadas na filosofia, nas artes, nas ciências, tanto quanto nas Sabedorias Tradicionais, que modernamente tentamos trazer à tona, em coerência com nossa história e suposta destinação.

Sabemos que nada é, por si só, autossuficiente, individualizado - e o Estruturalismo nos indica a variação do objeto pela sua simples posição em relação a outro. Mas aquele dentre nós que se denomina "o outro", longe ou próximo de mim, ligado ainda que só por pensamento, de certo modo me repete, e é o que eu sou.

Nós que escrevemos não podemos estar desinteressados, desamorosos, desligados de ação com relação a algo ou alguém. A verdade é que, para degeneração ou o aprimoramento de nós mesmos ou do mundo, estaremos irreversivelmente influindo, pois não se dá a interrupção da energia circulante que é veículo natural, de nós para fora, de fora para dentro de nós.

Se a poesia nos unge, não podemos permanecer na superfície, mas assumir missão, fazendo reverter naquela química sagrada de dentro de nós e na roupagem da magia, depuradas e essenciais, as ideias e não, nos conservar sem meios de defesa e acomodados por um prestígio convergente (e que além de tudo será precário).

A poesia também provém da fala do silêncio, mas ela tem o seu ministério e terá de o exercer. E nele temos de compilar para borrifar o indizível. Revelar a fala do universal, hierarquizando o passo para ser o inefável, compartilhado. E aquele que não participa é o mesmo que não ter nascido. Tanto em grandeza como em pequenezas, tem de se plantar nossa possível atuação em que, supondo muitas vezes estarmos nos doando, o que estamos é recebendo. Na obra "A Vigésima Quinta Hora", Constantin Virgil Gheorghiu diagnostica com genialidade e coração, ser essa nossa era apocalíptica do Sacro Colégio, conta que, da perspectiva da cadeira de São Pedro, ao alto e à distância, ele enxergava em bloco sem a justa identificação, as coisas e pessoas; mas que agora, para ele, um rosto próximo, necessitado de acolhida, continha todos os elementos de grandeza a polarizar o seu amor.

E nem sempre precisamos invocar, para a simplicidade de nossas afirmações - como pilares do pensamento e pólos da palavra, em sabedoria e música como traz a Poesia, os primeiros filósofos - como Heráclito, Pitágoras, ou Shelling e Hegel. Nem Safo ou Píndaro. Ou Einstein. E não nos baseamos em figuras de cientistas ou profetas, mas ouviremos, em silêncio atento, o nosso imensurável coração.

Energias cósmicas, telúricas, as humanas, divinas, coletivas e individuais afetam os nossos ritmos, e então não tem fim a nossa dependência - a começar pela gratuidade de nossas interações e mesmo a clarividência. É o tempo - embora invenção intelectual para no mundo nos equilibrarmos, um chamamento, e que estará no peito até do homem dito sem cultura, cuja fala também tem o que dizer.

Para nós que escrevemos é a palavra o grão que engendra a fecundação - e essa meta não termina em nós, se inclinando a alcançar aquela categoria que chamamos de oposição ou continuidade, a tempo, eternidade. Que, deste planeta de exílio, nossa palavra emitida na esteira do som, não desaparece, varando as cósmicas imensidões.